terça-feira, 4 de abril de 2006

A primeira aula da Terceira Vaga

Já passaram uns anos valentes desde que li duas obras de Alvin Toffler, para além de ter visto alguns dos seus documentários na televisão. Logo nessa altura me impressionaram bastante, e ainda hoje as suas repercussões na minha maneira de pensar e de tomar perspectivas globais sobre as coisas se fazem sentir.
Quando, durante a semana que passou, procurava na Net sites e materiais sobre portefólios, encontrei, em vários sites que pesquisei, a citação que usei no meu slide da aula de ontem, Os analfabetos do século XXI não serão os que não conseguirem ler e escrever, mas sim aqueles que não conseguirem aprender, desaprender e reaprender. É, na verdade, uma frase à Alvin Toffler.
Também é verdade que, hoje em dia, já se fala abundantemente em "aprender a aprender", mesmo em círculos de pensamento e discussão que, se calhar, nunca tiveram contacto ou conhecimento com as obras de Alvin Toffler, que seguiram outros caminhos.
A aula de ontem - e os comentários finais de todos os alunos participantes na aula deixaram apreciações nesse sentido - foi uma experiência "de terceira vaga" que nos colocou a todos - licenciados da "segunda vaga" - perante a nudez recíproca de todos, em que fomos confrontados com a relatividade da nossa sabedoria tradicional, consagrada nos títulos académicos que ostentamos, e ali estivemos, ignorantes, "desaprendidos", a ter de aprender de novo. E, ironia das ironias, enquanto enfrentávamos, titubiantes, os caminhos novos em que nos tinham colocado, foi do lado do apoio seguro com que contávamos que as coisas revelaram um dos lados frágeis desta modalidade de ensino-aprendizagem de terceira vaga. O professor "caiu" várias vezes. Curiosamente, talvez por isto mesmo, o à-vontade dos alunos foi crescendo aos poucos: é que o professor "caía", mas levantava-se pouco depois; desaparecia e voltava, sem se deixar perturbar pelos impedimentos das maquinarias e dos fluxos de informação que serpenteavam na rede e chegavam ao destino certo ou se tresviavam no caminho. E nós, os alunos ignorantes que ali continuávamos, aos poucos, fomos tomando conta da tecnologia. É que, sem que o planeasse, sem que o previsse, o professor acabou por nos dar uma ajuda preciosíssimo: isto não mata, isto não dá choque, isto não queima as mãos! Por isso, a aula acabou, penso eu, com todos nós a termos a certeza de que a tecnologia é uma coisa que existe para ser posta ao nosso serviço. No fundo, penso que é aquela sensação do condutor automóvel quando finalmente deixa de ter medo do poder de velocidade do carro e sente espalhar-se no corpo a percepção de que a velocidade do veículo será sempre aquela que ele quiser imprimir à máquina.
Ora o que esteve verdadeiramente em questão nas "quedas" do professor foi que os alunos tiveram tempo!... Deixem-me explicar: Penso que o maior problema das tecnologias modernas e das novas aprendizagens tem quase sempre a ver com o tempo... de digestão. É assim: só nos saberá bem o peixinho cozido do jantar depois de termos feito a digestão do lombozinho assado do almoço. As coisas novas, os novos "apports" têm de ser digeridos depois da digestão anterior ter tido o tempo necessário para que se completasse satisfatoriamente. Hoje em dia, as coisas vêm quase sempre em catadupa.
Mas nós ontem tivemos tempo de ir digerindo as coisas aos poucos, uma dentadinha de cada vez. Assim soube muito bem.
É assim que deveria ser sempre com os nossos alunos. E não é, pois não?

Sem comentários:

Enviar um comentário