sábado, 17 de março de 2018

O Grande Irmão está vigiando-nos...

Estou a orientar, em co-autoria, uma acção de formação para professores e psicólogos.
Anteontem recebi um email do colega coordenador do Centro de Formação que enquadra a formação. Dizia a missiva, no principal, que tinha recebido um email de uma colega, formanda, a lamentar-se de que eu não havia respondido ao seu email (já vamos em 3 emails); bem, afinal, a colega não me havia mandado um email, mas sim dois.
Fui ver o que se passava, e constatei que os emails da colega (de conteúdos legítimos, circunstanciais e, por isso, a justificarem uma resposta pronta da minha parte) tinham sido enviados para um endereço de email, sim, com o meu nome, mas cuja existência eu desconhecia, ponto.
Quando disto informei o colega coordenador, ele explicou-me que o sistema informático gera automaticamente um endereço virtual (e a respectiva caixa de correio) para o professor formador, facto que eu também desconhecia absolutamente... Depois acrescentou que, não obstante, também automaticamente faz o reencaminhamento das mensagens para o endereço de email que o professor formador tenha fornecido ao centro de formação para ser usado no âmbito da acção de formação.
Eu disse ao meu colega coordenador - pessoa por quem tenho muito respeito e estima - que não tinha recebido nada da colega que se compreensivelmente se afligira com a minha falta de resposta, nem antes das datas dos seus emails, nem nesses dias, nem depois.
A isto o meu colega respondeu-me que o sistema, isso, o sistema, lhe mostrava que eu tinha recebido na caixa de correio do endereço que forneci ao centro de formação os emails encaminhados a partir da caixa de correio do endereço automaticamente criada para mim pelo sistema quando eu fui oficialmente designado formador da acção de formação que ia ministrar em co-autoria. Uff!...
Perante esta "certeza", "comprovada", do sistema, fui novamente ver todas as minhas caixas de correio 'on line'; inclusivamente, as secções de 'spam'. Nada! Nem uma única letra ou arroba perdido que pudesse indiciar a presença de um, quanto mais dois!, email perdido.
E pus-me a pensar: olha se isto fosse um assunto sério que tivesse de ser dirimido em tribunal... Era a minha palavra contra a do sistema. Na qual o juiz encontraria a verdade? Bem, felizmente isto aconteceu entre pessoas que se respeitam e confiam entre si, e o caso foi identificado - e morto! - à nascença.
Entretanto, será esta a crucialmente preocupante questão? No meu ver, ainda não é. A crucial questão, para mim, tem a ver com estes sistemas implacavelmente cegos e radicalmente ininteligentes que, por mais subsistemas que se criem para retroactivamente (vulgo 'feedback') verificarem (vulgo, 'checarem') a correcção dos procedimentos do sistema para se evitarem os erros, mostram falhas - falhas graves. Que ditam estupidamente e acriticamente "ocorrência verdadeiras", "certificadas" por 'bits' electrónicos disparados não sei de onde criando realidades que não existem. A fazer lembrar a citação que ainda hoje li de Nassim Nicholas Taleb: «Loss of touch with reality is the plague of our time» (A perda de contacto com a realidade é a praga do nosso tempo)
Resumindo: os olhos, os tentáculos, do Grande Irmão são cada vez mais extensos e dissimulados; e muito provavelmente as mentiras que criam sobre as pessoas utilizadoras - quantas delas compulsivamente obrigadas porque cada vez mais se obrigam os utentes de tudo a comunicarem apenas pela Internet! - também aumentarão na mesmma medida da dissimulação do controlo.
Como eu desabafava com o meu querido amigo professor coordenador, isto é kafkiano, orwelliano, ou huxleyliano?

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